Na rotina dura das mães, sol é alívio na espera pelos filhos prematuros 1i1l61

Mulheres que vivem meses no hospital enrolam o bebê no corpo para estreitar os laços com os filhos internados c3l5j

Publicado em: 07/06/2025 | NATáLIA OLLIVER / CAMPO GRANDE NEWS 666t2q


Todas as sextas, mães enrolam lençol no corpo para andar com os prematuros no sol (Foto: Juliano Almeida)

Há dias sem ver a luz do sol, um grupo de mães comemora aliviado poder, enfim, sair dos quartos. Com os filhos prematuros e internados nas unidades neonatais do HRMS (Hospital Regional), um ato tão simples foge à rotina, não por falta de vontade, mas de tempo ou restrições médicas dos filhos. A jornada delas dentro do local é longa e chega a durar meses. Todas as sextas, o alívio vem em forma de luz e alguns minutos com os filhos colados ao corpo.

Elas eiam nos gramados em frente ao hospital e observam a reação dos filhos amarrados a elas com lençóis, em uma técnica chamada Canguru. Ali, a ideia é aproximar ainda mais as mães dos bebês e estreitar os laços através da pele. Os pais também participam, mas a maioria ali sã mulheres.

Marisa Pereira, de 28 anos, não consegue descrever a sensação de ter o mundo envolto aos seus braços. Apesar de já ser mãe de dois filhos, essa é a primeira vez que precisa ficar internada assim. As gêmeas, Melinda e Melany, chegaram de surpresa e a gravidez foi de alto risco. Como previsto, elas nasceram prematuras, mas com quase um mês de internação  já estão com 1,630 kg e 1,590 kg.

Natural de Paranhos, município localizado a 461,4 km de Campo Grande e próximo do Paraguai, além da situação com as filhas, Marisa ainda tem que lidar com a saudade dos outros mais velhos e com a distância de casa. Devido à complexidade do caso, ela precisou ter o parto em Campo Grande e daqui nunca mais saiu, pelo menos por quase 30 dias.

“É difícil de explicar, porque é muito gostoso, é um amor infinito, é um amor que não sei como explicar. Foi uma bênção de Deus. Eu vim só pra fazer o acompanhamento aqui, que eu já estava fazendo, aí fiquei. Minha situação era complicada, eu tinha pressão alta que era silenciosa, não reagia no meu corpo, só na questão de ar mal mesmo.'

A chegada da dupla foi um choque para Marisa, que esperava apenas uma das meninas. Quando descobriu a gravidez, durante muitos meses não fazia ideia de que iria gerar duas vidas em vez de uma. A notícia chegou um bom tempo depois.

“Eu estava me tratando, e no mês que deixei o meu comprimido já engravidei. Descobri que eram duas no quarto mês e eu surtei, porque, além de não ser planejado, vinham dois. Antes de saber que eram mais, eu estava me preparando apenas para um bebê.'

Com as duas enroladas nela, tomando o sol da manhã, Marisa ri e conta que não sabe como elas cabiam na barriga. “Na minha barriga não aparecia que tinha duas, não sei como elas ficavam aí dentro, como cabia.'

A médica neonatal Judina Lilian Lima explica que ali a pressa não adianta nada e que a alta não é feita para a mãe, mas sim para o bebê. Então, o tempo de permanência nas unidades pode ser longo e exaustivo, já que a mãe fica privada da vida e vive em função da criança.

No final, a alta do bebê prematuro exige tempo, estrutura e paciência. “Eu entendo a ansiedade das mães, mas sempre repito: a alta só acontece quando o bebê está pronto. Não adianta querer apressar.' Ao comentar o maior desafio vivido pelas famílias, ela destaca de primeira o tempo de internação.

“Tem casos de mais de um mês, às vezes três, e o mais longo que já acompanhei durou oito meses. Mas era um bebê que nasceu com parada cardiorrespiratória, sem oxigenação adequada e com paralisia cerebral grave. Cada caso é um caso.'

A classificação dos nascimentos prematuros também interfere diretamente na estadia dos pequenos. Prematuros extremos, com até 28 semanas, tendem a precisar de mais tempo e cuidados intensivos, enquanto os moderados, entre 28 e 34 semanas, menos.

Hoje, o HRMS conta com três unidades neonatais: UTI Neonatal, Unidade Intermediária e o espaço do Método Canguru. Falando nele, o método é referência no mundo e o hospital foi pioneiro no Estado.

Para quem não sabe o que significa, a técnica consiste em amarrar o bebê ao corpo da mãe apenas de fralda, com as pernas abertas e em contato com a pele dela ou do pai. Ele é um modelo de cuidado humanizado que virou referência em Mato Grosso do Sul e agora no país, já que o hospital ensinou o resto do Brasil a fazer.

A médica pontua que o Método Canguru foi criado por médicos colombianos em um cenário de escassez e abandono hospitalar. Ele surgiu a partir da ideia de manter o recém-nascido em contato direto com o corpo da mãe. Tudo começou porque os colombianos recebiam uma taxa alta de abandono das crianças assim que elas nasciam. Isso antes dos anos 80, especificamente em 1979.

O calor materno, que antes era um recurso emergencial, acabou mostrando ser um poderoso aliado no vínculo afetivo e na amamentação. “Pra mim, foi o que surgiu de melhor nos últimos 20 anos na neonatologia. Ele traz a mãe pra dentro da unidade, envolve a família, melhora a neuroplasticidade do bebê e reduz sequelas.'

Quando a mãe não está disponível, os profissionais de enfermagem assumem o contato pele a pele, ainda que sem a posição tradicional do Método Canguru, pois essa é feita apenas pelos pais ou responsáveis pelo bebê.

O foco, segundo a enfermeira Ana Carolina Pereira, coordenadora estadual do Método Canguru, é manter o cuidado centrado na individualidade de cada bebê e de cada família. Há anos no hospital e no setor neonatal, ela conta que acompanhou todo o processo de mudança na forma como os pais acompanhavam o desenvolvimento dos bebês prematuros.

“Quando entrei, a família tinha hora marcada para a visita. Hoje, ela está completamente inserida. Antes eram 8 leitos de UTI e 4 convencionais. Agora temos 10 de UTI, 20 na unidade de cuidado intermediário convencional e 5 na unidade Canguru, todos pensados para esse atendimento mais humano e integrado.'

Ela pontua que o HRMS é Centro de Referência Estadual no Método Canguru desde 2012, mas que o treinamento começou antes, lá para os anos 2009.

“São 5 tutores, eu sou uma. Junto do método, começou a reforma na unidade, porque ele precisa de acolhimento especializado. Nós atendemos toda a família. Sobre as dificuldades, antes a família não tinha como fazer parte, mas agora tem. Quando eu entrei, mãe e pai tinham visita estipulada. Agora temos visitas de todos: avós, irmãos mais velhos. Os bebês chegam a ficar, em média, 3 meses internados.'

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