100 anos de Nilton Santos: como foi o fim da vida de um ídolo que nunca esqueceu o Botafogo 673z3x

Camisa 6 lidou com Mal de Alzheimer, mas reteve memórias do Alvinegro; ge conta a história do grupo que se mobilizou para dar apoio financeiro e manter vivo o legado do craque 22z5v

Publicado em: 16/05/2025 | GLOBOESPORTE.COM / BáRBARA MENDONçA 2i1c12


A "Enciclopédia do Futebol" se esqueceu de muito. Em uma clínica geriátrica na Gávea, Zona Sul do Rio de Janeiro, Nilton Santos viveu seus últimos dias sem reconhecer sempre os "anônimos" que o visitavam com maior frequência. Mesmo acometido pelo Mal de Alzheimer, o lendário camisa 6 sempre reteve as memórias dos quase 20 anos que viveu no Botafogo, seu único clube no futebol profissional.

Descrito como uma pessoa humilde e simples, que perdeu chances de aproveitar o próprio nome para fazer dinheiro, Nilton viu todas as suas contribuições ao Botafogo serem retribuídas. No fim da vida do craque, um grupo de alvinegros se uniu não apenas para auxiliar financeiramente - mas também para garantir carinho e dignidade a Nilton até o último respiro.

O ge conta essa história para comemorar os 100 anos da Enciclopédia, que seriam completados nesta sexta-feira, 16 de maio de 2025.

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A "Comunidade Botafoguense" ou ComFogo, como é chamada pelos integrantes, surgiu no início dos anos 2000 impulsionada por fóruns de debate na internet. A ideia do grupo era elaborar projetos que favorecessem o clube - como reformas no ex-CT de Marechal Hermes - e seus membros históricos, com arrecadação de cestas de alimentos para ex-jogadores, entre outros.

— Quando o Botafogo foi rebaixado (em 2002), falei: “agora eu tenho que fazer alguma coisa pelo clube". Não era mais sócio, meus filhos eram maiores. Pensei “vou tentar entender o que é o Botafogo'. Entrei na internet e acabamos montando um grupo chamado ComFogo, a Comunidade Botafoguense. Montamos um estatuto, fizemos tudo direitinho e esse grupo começou a crescer — disse Paulo Kleinberger, um dos fundadores da ComFogo.

A ComFogo não foi fundada com foco em Nilton Santos, mas o craque virou o centro de uma empreitada específica, anos depois, após um lamento público de Maria Coeli - a segunda esposa do camisa 6, que cuidou dele até seu falecimento.

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— Saiu uma matéria no jornal com a Coeli, estava meio triste, chorosa. Tinha saído um outro artigo, se não me engano em um jornal de Brasília, em que tiraram uma foto do Nilton dormindo. Ela falou “gente, parece que meu marido estava morto. Ele não tá morto, o Nilton tá vivo, não tá abandonado, está aqui na clínica' — disse Marcio Padilha, ex-VP de comunicação do Alvinegro e membro da ComFogo.

Nilton foi internado durante a gestão de Bebeto de Freitas, que "sempre fez questão de ajudar" e garantiu que o Botafogo pagasse a estadia do ex-lateral na clínica. Mesmo com o apoio financeiro do Alvinegro, havia gastos extras, como com remédios e um acompanhamento prolongado de enfermagem.

Sem poder acompanhar Nilton 24 horas por dia, Coeli pediu que os torcedores do Botafogo visitassem o craque na internação, evitando que o camisa 6 asse muito tempo sozinho.

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— Foi quando eu, Paulo, Pâmella Lima, Maria Júlia Cancella e Cristina Saraiva resolvemos fazer uma visita, já que Coeli abriu a oportunidade. Chegamos lá e encontramos na porta: “Seja bem-vindo, mas não fale mal do Botafogo'. Eram as plaquinhas que ele fazia. Na aposentadoria, o Nilton começou a pintar quadros, fazer artesanato, tinha algumas atividades. Lembro como se fosse hoje de que, quando olhei para a placa, falei: “Chegamos na casa do Nilton Santos' — completou Marcio.

Outro alvinegro, Flávio Lopes, impulsionou uma virada de chave nas finanças de Nilton. Foi dele a ideia de lançar uma camisa retrô comemorativa à carreira do craque na marca Estilo Carioca. O Botafogo negou em um primeiro momento - afinal, a Fila era a empresa licenciada para produtos de vestuário.

Mas houve ampla mobilização de torcedores na ComFogo. "Uma camisa do Nilton Santos? Eu compraria!" Por fim, tanto o clube quanto a fornecedora de material esportivo abriram mão e permitiram a comercialização da peça. Foi um sucesso absoluto: depois da camisa alvinegra, vieram ainda as versões branca, preta e amarela (esta, fazendo referência à Seleção).

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— A partir desse momento, a Coeli ou a ter uma receita. Ela tinha um carro todo requenguela (velho, caindo aos pedaços), conseguiu trocar. Com esse dinheiro trocamos geladeira, cama, colchão. O quarto dele, que já era bonitinho, ficou top, mas não era um dinheiro para resolver todos os problemas. Royalty de camisa é um negócio que acaba, tem um ciclo — completou Padilha.

Para não contar apenas com a sorte e o caráter variável dos royalties, Paulo teve a ideia de criar o Fundo Nilton Santos. Com aportes mensais, sem valor definido (cada um contribuía com o que podia), cerca de 35 cotistas fixos davam a Nilton Santos e Maria Coeli uma mesada. Esse valor era revertido para despesas do cotidiano e proporcionava melhor qualidade de vida a Nilton na clínica.

A partir daí, surgiram até recompensas, em acordo com a esposa Coeli. Os cotistas podiam visitar Nilton aos sábados - não havia restrições a não contribuintes em outros cenários -, recebiam itens comemorativos como medalhas e cards autografados, entre outros. O essencial era garantir que a verba continuasse chegando aos cofres de Nilton e da clínica.

As memórias de Nilton Santos

O carinho dos visitantes com Nilton Santos por vezes se transformava em lágrimas, mas o camisa 6 nem sempre percebia. Falava pouco, mas tinha riso fácil e era sempre muito solícito. Não tinha dimensão do tamanho da própria história no Botafogo e achava a idolatria até um certo exagero. Mas o Botafogo era parte integral de sua vida, não apenas na decoração do quarto.

— A luz que tinha aquele quarto, que saía das pessoas quando tiravam a foto, agradeciam muito pela oportunidade de estar com o Nilton Santos. Aquele projeto que a gente desenvolveu foi muito bom para o Nilton e para as pessoas que tiveram oportunidade de conhecê-lo em vida — acrescentou Paulo Kleinberger.

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Os momentos de maior alegria em meio à internação eram justamente quando Nilton recebia ex-jogadores e companheiros de Alvinegro. Sentado em sua poltrona, sempre com um bombom Ferrero Rocher e um sorvete de flocos por perto, o camisa 6 conversava com nomes como Cacá - ex-lateral-direito, que visitava a clínica com frequência - e rememorava os bons tempos no Botafogo.

Nilton nem sempre queria comemorar seu aniversário, mas por vezes pediu "um festão". O grupo de torcedores se organizou para realizar os eventos em um salão na clínica da Gávea, com direito a pianista e decoração temática, contando ainda com a presença de nomes como Zagallo, Rildo e Amarildo.

— Quando os ex-jogadores chegavam, a alegria do Nilton de receber os amigos da época era uma coisa que dava uma satisfação. Era uma loucura, uma correria, porque era comprar brinde, fazer enfeite, mesa decorada, medalhinha, camisa especial. A gente aprontou várias situações que fizeram o dia a dia dele na clínica mais feliz. ou a ter enfermagem 24 horas, estava sempre assistido. Teve um final muito digno — disse Marcio Padilha.

Fim e legado

Em vida, Nilton ainda pôde ver o lançamento de sua estátua - a primeira em um pavilhão de ídolos no setor Oeste do estádio que hoje leva seu nome. Também deu entrevistas para seu site oficial, elaborado pela ComFogo, que tornou-se uma forma de registrar a vida e a carreira do camisa 6.

Nilton Santos morreu em 27 de novembro de 2013, aos 88 anos, vítima de uma infecção pulmonar agravada por um quadro de insuficiência cardíaca. A contribuição financeira do grupo seguiu, direcionada a Maria Coeli, mas a fiel escudeira do camisa 6 faleceu menos de seis meses depois.

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Em 2015, após o pedido do então presidente Carlos Eduardo Pereira para que a torcida do Botafogo chamasse o estádio de Nilton Santos - antes da mudança oficial do nome -, membros da ComFogo foram apresentados à primeira família de Nilton. Ao se casar de novo com Maria Coeli, o craque deixou de ter contato com a primeira esposa Abigail, assim como os filhos Carlos Eduardo e Andréa.

Um evento em comemoração ao aniversário de Nilton no estádio solidificou a relação entre as partes. Hoje, há um grupo voltado à perpetuação da memória do camisa 6 - que inclui, entre outros, a neta Hanna Santos, ex-funcionária da Botafogo TV.

— Ao longo dos últimos anos me dediquei a pensar como poderia contribuir para manter viva a memória (do Nilton), principalmente para as próximas gerações. Existe o projeto de um filme que vai contar a história dele, principalmente abordando quem foi Nilton fora dos campos, desde pequeno até o fim da vida. Acho uma maneira bonita de eternizar sua história — explicou Hanna ao ge, acrescentando:

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— Tenho, em parceria com o Botafogo, projetos de produtos licenciados que fazem parte sempre dos produtos do clube, muitas vezes até colocando os jogadores do elenco envolvidos nas campanhas de lançamentos dos produtos. Forma de envolver o ado e presente. Nilton Santos é um dos maiores ídolos do clube, o jogador que só vestiu essa camisa, e falava de Botafogo sempre com sorriso no rosto. Então, ele sempre será lembrado, homenageado e fará parte de projetos do clube com o intuito de contribuir para esse mantenimento da história dele.

Na vitória sobre o Estudiantes, na última quarta-feira, o clube iniciou uma série de ações em comemoração aos 100 anos de Nilton Santos. O ex-jogador estampou a flâmula da partida, assim como um patch na camisa do Botafogo e copos comercializados ao público.



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