Com bandeira e uniformes novos, futebol na Síria ganha sobrevida após queda de Bashar Al-Assad 301m5o

Ainda impedida pela Fifa de atuar no país, seleção síria volta a campo nas Eliminatórias da Copa da Ásia com esperanças de novos tempos com fim de regime autoritário de mais de 50 anos 6o2z3r

Publicado em: 24/03/2025 | GLOBOESPORTE.COM / CAíQUE ANDRADE 5v5x1u


Depois de cinco décadas, a Síria se vê livre do regime autoritário da família Assad. Desde a queda de Bashar Al-Assad, em dezembro, o país vive um momento de incertezas, mas esperanças de se reconstruir de forma mais democrática e inclusiva. O ge te mostra agora como o futebol local segue na mesma toada.

Nesta terça-feira, a seleção síria entra em campo repaginada, com novos uniformes e novas cores, acompanhando a mudança da tradicional bandeira nacional, que representa um símbolo antidinastia Assad. O vermelho dá lugar ao verde nas vestimentas dos atletas.

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Como mandante, a Síria enfrenta o Paquistão, em jogo das Eliminatórias da Copa da Ásia, mas a partida será realizada no estádio Prince Abdullah Bin Jalawi, em Al Hufuf, na Arábia Saudita. Isso porque, desde 2011, a Fifa proibiu a realização de jogos internacionais em territórios sírios, por conta da guerra civil que ocorreu no país nos últimos 14 anos .

— A guerra civil causou a morte de centenas de milhares de pessoas e deslocou milhões de cidadãos na Síria. O conflito fragmentou o país, com diversas facções controlando diferentes regiões, levando a uma crise humanitária de grandes proporções. A proibição imposta pela Fifa reflete a insegurança e a instabilidade que dominaram o país ao longo desses anos — explica Fernando Brancoli, Professor de Geopolítica do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ.

Futebol da Síria sobrevive

Liga Síria se manteve

Mohamed Dakouri, presidente interino da Federação Síria de Futebol (FA), deu entrevista recente itindo o péssimo estado dos estádios locais, que em sua maioria foram utilizados como bases militares e danificados pela guerra. Segundo Dakouri, “muitas das instalações precisam de reparos'.

Apesar disso, a Liga Síria seguiu sendo disputada normalmente nos últimos anos, com exceção da temporada 2010/11, quando foi suspensa. A temporada 2024/25 está paralisada desde os ataques das forças rebeldes ao governo de Bashar Al-Assad, em dezembro.

Disputado por 12 equipes, o campeonato local dá uma vaga na fase classificatória da Champions League Asiática. Os jogos costumavam ser realizados em áreas dominadas pelo antigo governo, nas cidades de Damasco, Hama e Latakia.

Seleção Síria consegue competir

Apesar da proibição de atuar em casa e da divisão do elenco, que sofre com boicote de jogadores por questões políticas, a seleção síria de futebol se supera e chega a ser competitiva . Em 2018, mesmo em meio à guerra civil, a Síria ou perto de classificação para a Copa do Mundo da Rússia, o que seria um feito inédito.

Na ocasião, foi derrotada pela Austrália, na prorrogação, com um jogador a menos, na fase final das Eliminatórias Asiáticas. Depois, os australianos acabaram se classificando para o Mundial com vitória sobre Honduras na repescagem internacional.

Mais recentemente, a Síria ou de fase e disputou as oitavas de final da Copa Asiática, em 2023, sendo eliminada pelo Irã, nos pênaltis. Nas Eliminatórias Asiáticas para a Copa do Mundo de 2026, foi eliminada na segunda fase, somando sete pontos, atrás de Japão (18) e Coreia do Norte (9). Fernando Brancoli expõe as dificuldades da seleção síria para voltar a atuar em seu país.

"Para que a Síria possa voltar a jogar diante de seus torcedores, é essencial que o país alcance um nível de estabilidade política e segurança que assegure a integridade de atletas, espectadores e instalações esportivas", afirma o professor de Geopolítica da UFRJ.

O futuro do futebol sírio

A seleção sub-20 da Síria já disputou, com os novos uniformes, a Copa Asiática da categoria, em janeiro deste ano. A equipe terminou a campanha em terceiro lugar no Grupo D, atrás apenas das mais tradicionais seleções de Coreia do Sul e Japão.

A juventude é tratada como chave para o fortalecimento do futebol na nova Síria. Um dos representantes da nova geração é Qais Hassan, de 21 anos, que é refugiado no Brasil desde 2018 e atua pelo clube Pérolas Negras, com sede em Resende, no Rio de Janeiro. Ao ge, o jovem atacante comenta a esperança de novos tempos.

— A nova seleção da Síria está trabalhando para voltar melhor do que antes. Porque tem 14 anos que os times estão muito ruins, os campos, os vestiários... Estava tudo muito ruim lá, com o Bashar Al-Assad. Seria bom para mim e para todo o povo da Síria, que viveu muita coisa difícil. Mas agora vai precisar de um tempo para melhorar. Porque as coisas não mudam de um dia para o outro — disse, antes de acrescentar sua grande motivação no futebol.

"Estou esperando a oportunidade de eles me chamarem para jogar na seleção. Eu tenho de coração a vontade de realizar meu sonho na seleção da Síria e ajudar o povo de lá a ser feliz", afirma Qais Hassan.

+ Como é a vida do sírio que joga no Brasil para tirar família de campo de refugiados

Desafios sírios não acabaram

Qais vive seu primeiro ano como atleta profissional do Pérolas Negras e tem como principal foco ajudar sua família, que vive em um campo de refugiados desde que perdeu a casa por conta da guerra na Síria. Apesar de acreditar em dias melhores, o atleta sabe que as dificuldades enfrentadas por seu povo ainda não acabaram.

— Foi muito difícil perder nossa casa na Síria. Sempre penso na minha família. Eles vão ficar para sempre em campo de refugiados? Como vou ajudá-los? Agora, sem o Bashar Al-Assad, eles vão poder voltar para a Síria. Só que tem que esperar um tempo. Não tem onde morar. E o exército do Bashar Al-Assad está matando as pessoas. Então, ainda não acabou a guerra mesmo. Mas de um tempo para frente vai acalmar tudo, se Deus quiser — conclui Qais Hassan.

O jogador se refere aos confrontos nas províncias costeiras de Latakia e Tartus, que resultou em centenas de mortes no início deste mês. O conflito foi protagonizado por apoiadores do antigo regime e forças do governo interino. O professor Fernando Brancoli explica os desafios atuais da Síria.

— Os recentes confrontos indicam que a Síria ainda enfrenta desafios significativos em sua busca por estabilidade. Esses episódios de violência sectária ressaltam a fragilidade do momento atual e a necessidade urgente de iniciativas de reconciliação nacional. Sem um esforço coordenado para promover o diálogo e a inclusão, há o risco real de que o país possa mergulhar novamente em um ciclo de conflitos prolongados.

O presidente interino Ahmad Al-Sharaa prometeu que o país fará a transição para um sistema que inclua o mosaico de grupos religiosos e étnicos da Síria em eleições justas, mas os céticos questionam se isso realmente acontecerá. Enquanto isso, o futebol sírio resiste e vislumbra tempos melhores.



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